Biomas: produtos típicos trazem inovação, criatividade e mais brasilidade aos bares
Produtos dos biomas nos bares. Já reparou? Não é novidade que o Brasil, pela riqueza dos ambientes naturais, aliada à diversidade cultural, tem na gastronomia um dos seus maiores potenciais, possibilitando variedade de pratos tradicionais e novas criações. Diante da pluralidade, a valorização de produtos nacionais também chegou aos balcões de bares para a composição de drinques, conferindo um gostinho de brasilidade aos copos e taças.
A ação do BCB São Paulo, Somos Mais Bar é prova disso. Criada para que bartenders possam divulgar seus trabalhos, a iniciativa tem recebido novidades de diferentes lugares do País e surpreendido pela criatividade e uso de ingredientes, como afirma o Diretor de Educação do evento, Marco De La Roche.
Em conversa com alguns profissionais do setor, é possível perceber a importância dos biomas na composição de novas receitas alcoólicas e zero álcool, com frutas, ervas e especiarias próprias de cada local. Ganho para a coquetelaria brasileira que pode conquistar maior espaço nas mesas de bares e restaurantes reforçando a identidade, em um mercado em que a inspiração na cultura etílica norte-americana e europeias prevalece.
Para demonstrar, convidamos especialistas para trazer novas combinações e sabores através da potência do bioma nos bares:
– Pantanal:
Conhecedor do local, o bartender e gestor de bebidas, Fabio Hasegawa, tem apostado na biodiversidade pantaneira e na importância dos insumos de qualidade e frescos nas suas receitas.
Algumas das suas recomendações são: a Guavira fruto cítrico para preparos com citrinos, gengibre, baunilha; a bocaiuva, por sua característica adocicada, nas opções sem álcool que levam ingredientes como caramelo, cítricos, frutas tropicais e coco e a laranjinha de Pacu que pela acidez, harmoniza com pêssego, laranja, limão e tangerina.
– Cerrado:
Especialista também no uso de iguarias da região, o bartender Roberto Merlin, destaca três produtos, todos tradicionais da cultura regional: o pequi, que possui aroma e sabor autêntico, para infusões e xaropes e possibilita a combinação com ervas frescas e mentoladas, raízes amargas e pimentas. Seu óleo pode ser usado na finalização do processo
Neste quesito, a baunilha do cerrado também pede passagem e suas raspas dão um toque especial amadeirado, doce e envolvente no acabamento da receita. Para o profissional, a iguaria harmoniza com frutas maduras, sauers, cacau, laranja e limões dos tipos taiti, cravo e siciliano.
Já a Castanha do Baru pode ser batida com outra fruta ou como acompanhamento no drinque substituindo oleaginosas como as amêndoas.
– Pampa:
No sul do País, dentre os inúmeros ingredientes locais, o bartender Marcelo Pereira, investe na erva-mate, muito utilizada na coquetelaria.
A erva-mate combina com:
- limão;
- gengibre;
- folha de funcho nas harmonizações com gin e cachaça branca;
- butiá, fruto da região sul, indicado tanto no acompanhamento, quanto no preparo de drinques com bebidas amadeiradas, caso do bourbon whiskey e da cachaça envelhecida em barril de amburana ou grapia.
Uma dica: no interior da semente do fruto há uma amêndoa. Suas raspas podem ser usadas em processos de finalização.
– Mata Atlântica:
Na região de Ubatuba, chama a atenção o trabalho do bartender Caio Bonneau, que vem desenvolvendo coquetéis com base nos ingredientes da mata, tentando resgatar características dos povos locais e suas tradições
O profissional utiliza as frutas da família das mirtáceas, algumas bem conhecidas como a jabuticaba, o cambuci, a pitanga, outras menos, como a uvaia, o cambucá e a grumixama. Por terem sabores que mesclam acidez e dulçor e cascas adstringentes, em diferentes teores, possibilitam compor diferentes camadas de sabores e acrescentar um toque especial aos preparos alcoólicos e não alcoólicos.
Versátil, o cambuci pode integrar coquetéis com ingredientes com especiarias da região como pacová, ervas e plantas como capim-santo e gengibre e bebidas como gin, cachaça branca, vodca e as envelhecidas em barril de carvalho e outras madeiras – neste caso, na forma de xarope ou melado.
– Floresta Amazônica (Belém do Pará):
Sob o mesmo ponto de vista, quem aposta na diversidade do bioma amazônico para a criação de bebidas inusitadas é o publicitário e bartender Yvens Penna, do Muamba Bar.
No cenário repleto de variedades, ressalta o urucum, fruta com sabor levemente adocicado que também surpreende no quesito estético. De cor avermelhada, é indicado na produção de xaropes e para embelezar alguns twists como o “urucum pisco sour” e podendo ser usado em coquetéis sem álcool. Harmoniza com pisco.
Outra indicação, o ingá, pela suavidade do sabor combina com gin e também pode ser compor opções sem teor alcoólico.
Considerada uma erva aromática e com toque salino, a chicória, por sua vez, ganha espaço no preparo de drinques zero álcool ou pode ser acrescentada em receitas com cachaça ou tequila.
– Caatinga:
No bioma exclusivo do Brasil, o trabalho do empresário e consultor de bares e restaurantes, Maurício Campos surpreende. Pesquisador de cultura alimentar e líder do Slowfoodceara, já percorreu todas as regiões do País e demonstra conhecimento quando o assunto é coquetelaria
Diante a diversidade de produtos característicos locais, o profissional gosta de enfatizar dois, bem conhecidos, tanto para quem está do lado de dentro dos balcões tanto para quem está fora: o caju e o umbu – por conta das inúmeras possibilidades de uso e facilidade de conservação.
Por suas propriedades nutritivas e vitaminas (como C e A) são opções para quem não abre mão da saúde e também podem ser utilizados para substituir o açúcar convencional nos drinques, sejam eles com ou sem álcool.
Dentre as dicas estão: a umbuzada, bebida feita a base se suco de umbu com leite de vaca ou cabra, já testada com gaseificação de modo geral, como club soda, água com gás e o drinque com umbu, mel de caju e leite.
Em relação ao mel de caju, assim como a famosa cajuína, tem potencial enorme e combina com qualquer destilado, seja cachaça, gin, vodca e tequila. Com a gaseificação, torna-se uma bebida refrescante.
O especialista também lança mão da rapadura em substituição ao açúcar e combina com várias frutas e tipos de bebidas. Em uma das receitas ele faz uma releitura do Mojito, incluindo ingredientes como hortelã, xarope de rapadura, gengibre e refrigerante de gengibre.
Diante de tanta variedade e com todo esse aprendizado, oportunidades para experimentar novas receitas não faltam e, consequentemente, aplicar a potência do bioma nos bares e restaurantes.