01 a 03 de julho | 2024

Qual o próximo mixer da vez?

Conteúdo produzido por João Morandi exclusivamente para o blog do BCB São Paulo.

Particularmente eu cansei da água tônica. Não do produto, esse eu sempre adorei. Mas o mixer que outrora abriu caminhos para o gin, para o amargor na vida do paladar brasileiro e até mesmo figurou em receitas de whisky highballs, cachaça tônicas e espresso tônicas chegou num ponto que estagnou e limitou a coquetelaria. Todo novo produto que surge, já vem de fábrica com uma receita que leva tônica, como se nenhuma outra opção viável fosse possível.

Realmente, para temperaturas altas e misturas fáceis, as bebidas gaseificadas revelam-se excelentes mixers. Isso porque as sodas sempre tiveram lugar cativo nos balcões da coquetelaria moderna e receitas mais contemporâneas, trazendo uma bela textura ao sabor.

Para efeitos didáticos, permita-me falar rapidamente sobre a função de um mixer na coquetelaria. É um ingrediente importante e não alcoólico que tem função de trazer diluição, baixando a porcentagem de álcool por volume do drink. Essa classe de ingredientes traz também um sabor extra, realçando os sabores da mistura.

O mixer pode conter gás ou não. Ao longo da história da coquetelaria tivemos momentos em que Suco de Laranja e Suco de Cranberry brilharam muito, dando  um descanso aos paladares cansados do pétillante.

Já os gasosos mais usados são vinhos espumantes, refrigerantes, a simples e eficiente água com gás e até mesmo kombuchas e kefir são utilizados com essa finalidade de trazer o frescor e a acidez das bolhas para nossos paladares.

Em uma comparação afrontosa, as bebidas com gás são como a batata palha da coquetelaria. Esquisito né? Mas eu gosto dessa analogia e prometo que vou explicar. Confia em mim.

A utilização do gás carbônico nos líquidos de um cocktail possuem uma função muito clara e interessante na construção de sabores: adicionar uma textura diferente à nossa bebida.

Quando falamos de textura, estamos basicamente considerando a pressão que algo imprime na boca, e ativa fisicamente diversos nervos do nosso corpo.

 Inclusive existe um termo para designar os sentidos cutâneos de diferentes partes do corpo. Chama-se somestesia, e se traduz em sentir o que está ocorrendo na superfície e no interior do corpo através de tecidos cutâneos.

Portanto, quando sentimos dor, tato, temperatura e pressão, estamos recebendo estímulos em uma quantidade abundante de diferentes terminações nervosas que contribuem para as sensações que temos ,também,dentro da nossa boca.

Por isso eu brinco com a ideia da batata palha. As bebidas com gás são o “croc” da coquetelaria. Inclusive, nossos tecidos epiteliais são tão sensíveis que podemos perceber a diferença de textura entre bolhas de tamanhos diferentes.

Gaseificações naturais tendem a criar bolhas mais delicadas quando comparadas ao tamanho das bolhas mais grosseiras da carbonatação forçada - técnica que injeta gás carbônico nas bebidas de maneira artificial. Algo como a diferença da batata palha extra fina e a tradicional (que às vezes até corta a gengiva. Mas nem quero lembrar disso).

De tempos em tempos uma dessas delícias borbulhantes ganham os holofotes da situação e um amontoado de novos drinks surgem com a estrela do momento.

Fato é que a água tônica se revela um excelente mixer por trazer um grande gama de estímulos dentro da mesma latinha ou garrafinha. Seus sabores complexos contam com a acidez do CO2 e dos acidulantes, com o amargo do quinino e com o dulçor do agente adoçante.

Refrescante, e estimulante, parece harmonizar com quase tudo em que toca, recebendo bem os destilados sem maturação, alguns destilados maturados, vermutes, bitters, vinhos, cervejas, saquês, licores, sucos, cafés. Perdi o fôlego. Ela se dá bem como todo mundo.

Como substituir esse líquido unânime, popular, querido e agradável? Vamos voltar a algum "mixer"do passado?

São muitas perguntas. Nosso desafio vai ser grande. Não posso deixar de finalizar com mais perguntas.

E depois da tônica? Qual vai ser a bola da vez? 

 

Conteúdo produzido por João Morandi exclusivamente para o blog do BCB São Paulo.